A
jornalista Márcia Schweizer foi ao encontro do Dr. José Maria Pinheiro Madeira
que é Mestre em Direito do Estado, Doutor em Ciências Jurídicas
e Sociais e Doutor em
Ciência Política e Administração Pública para falar sobre a “Exclusão
do certame de candidato com nome no SPC e/ou SERASA”. Sendo assim, segue abaixo
um esclarecedor artigo jurídico escrito pelo professor Madeira.
- “Uma das restrições editalícias
mais polêmicas e que tem sido tema de diversas lides é, inquestionavelmente, a
que se refere à exclusão sumária de candidato em concurso público por constar
seu nome em ‘cadastros de restrição ao crédito’, tais como os conhecidos SPC
e/ou SERASA, de maneira generalizada. Trata-. se, muitas vezes, de uma restrição
imposta à própria participação em si do candidato nas etapas do concurso;
noutras, no ingresso ao cargo, após a aprovação em todas as etapas.
No que se refere ao primeiro
caso, ou seja, ao ato que impede um cidadão de ‘simplesmente concorrer a
determinado cargo público’, por via de concurso, seja ele qual for, configura
ainda mais gravoso o afronto à legalidade, pois conforme já sabido e relatado
neste trabalho, o momento legal de se exigir os preenchimentos dos requisitos
de habilitação contidos no edital é o do ato da posse, e não o da inscrição. É
de se registrar que este entendimento tem sido cada vez mais ratificado pelos
Tribunais, os quais têm classificado como ilegal o ato de exigir tais
cumprimentos editalícios já no momento da inscrição do concurso pelo candidato
ao pretenso cargo público.
Já no que tange à segunda
hipótese, que se refere a candidato regularmente aprovado em concurso público
em todas as etapas, mas cuja exclusão antecede a posse por motivo de investigação
social e constatação de que seu nome consta em algum cadastro de restrição ao
crédito, imposição esta condita no respectivo edital do concurso, também
entendemos que persiste a ilegalidade na restrição taxativa, todavia, outros
argumentos pendem para tal constatação.
Não é à toa que diferentemente do
particular, seja este pessoa física ou jurídica, a Administração Pública deve
observar, na prática de seus atos, vários princípios que a regem e que a impõem
a postura de preponderância diante do particular, tendo sempre como foco o
interesse público, sob pena de não observar, dentre outros princípios, o da
impessoalidade. Noutras palavras, não existe a Administração Pública para a
realização de seus próprios interesses, mas tão somente para o alcance do
interesse público, daí a sua obrigação de observar os princípios que a regem e
os quais controlam e limitam o seu poder, a fim de evitar excessos ou desvios
no que alude ao interesse colimado.
Ademais, diante da complexidade
que envolve a Administração Pública, haja vista o leque de interesses que esta
engloba mediante a sociedade, não há que se questionar que o fato de
generalizar seus atos, repetidamente e sem levar em conta especificidades,
equivaleria a um verdadeiro ‘abismo jurídico’. Felizmente, a própria evolução
do Direito e as decisões que emanam dos nossos Tribunais se incumbem de
atualizar a aplicação da lei, coibindo que atos desprovidos de flexibilidade e
cuja rigidez das leis o tornaram injustos ou ilegais sejam evitados ou
invalidados.
No caso em foco, em que um
candidato ao ingresso em cargo público é excluído e considerado reprovado por
ter, à época da posse, seu nome inscrito em cadastros de restrição ao crédito,
se nos parece esculpido de total falta de razoabilidade por parte do
administrador, característica esta que esboça o Princípio da Razoabilidade,
dando-lhe a conseqüente configuração da ilegalidade.
Pecará o administrador, se na
prática de seus atos e imbuído do poder que detém, agir de maneira
indiscriminada e reprovar todo e qualquer candidato que tiver seu “nome sujo”,
conforme o termo vulgarmente utilizado, constatado por meio de certidões que
são exigidas no edital do certame. A este propósito, há que se distinguir, e
aqui entra o dever do administrador de aplicar o princípio da razoabilidade,
entre o devedor contumaz que reiteradamente deixa de cumprir suas obrigações e
compromissos os quais assumiu, mesmo sabedor de que não detém recursos para
honrá-los, e que muitas vezes já se configura um verdadeiro estelionatário; e
aquele outro devedor que, independentemente de sua vontade e/ou por razões
momentâneas deixou de honrar alguns pagamentos, talvez pelo próprio fato de
encontrar barreiras no mercado de trabalho, e por isso mesmo, ter se empenhado
e obtido uma difícil aprovação em um emprego público. Ou seja, desclassificar
este candidato, seja no ato da inscrição ou no ato da posse, seria uma maneira
abusiva e totalmente infundada por parte do administrador, que ignorou a sua
obrigação de observar os princípios que regem a Administração Pública,
sobretudo o da razoabilidade.
Reportando-nos à defesa do
candidato, não restam dúvidas de que este deverá se valer do pré-citado
princípio da razoabilidade[1], o qual se furtou de observar o administrador
quando da exclusão daquele do certame público, e intentar uma ação de
conhecimento e mandado de segurança para conter o abuso da autoridade e reaver
o seu direito de ser nomeado e tomar posse do cargo público “ – Esclarece
professor Madeira.
[1]
O Princípio da Razoabilidade, que também é chamado de Princípio da Vedação do
Excesso, tem por escopo adequar e compatibilizar meios e fins para que se
evite, por parte do administrador público, restrições, excessos ou abusos
perante o administrado, já que este tem seu direito assegurado
constitucionalmente de ser tratado de forma impessoal pela Administração
Pública, e com a devida razoabilidade que exige cada caso.
Inobstante,
existe tal princípio para delimitar a própria atuação do administrador, pois
não é raro ver-se publicamente aquele que age em nome da Administração Pública,
tomando-lhe as vezes, agindo de acordo com seus interesses e valores pessoais e
ignorando o interesse público. Não é demais também lembrar que a razoabilidade
está intimamente ligada às reais necessidades da coletividade e à legalidade e
à economicidade públicas.
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