sábado, 15 de outubro de 2016

Exclusão do certame de candidato com nome no SPC e/ou SERASA

A jornalista Márcia Schweizer foi ao encontro do Dr. José Maria Pinheiro Madeira que é Mestre em Direito do Estado, Doutor em Ciências Jurídicas e Sociais e Doutor em Ciência Política e Administração Pública para falar sobre a “Exclusão do certame de candidato com nome no SPC e/ou SERASA”. Sendo assim, segue abaixo um esclarecedor artigo jurídico escrito pelo professor Madeira.


           - “Uma das restrições editalícias mais polêmicas e que tem sido tema de diversas lides é, inquestionavelmente, a que se refere à exclusão sumária de candidato em concurso público por constar seu nome em ‘cadastros de restrição ao crédito’, tais como os conhecidos SPC e/ou SERASA, de maneira generalizada. Trata-. se, muitas vezes, de uma restrição imposta à própria participação em si do candidato nas etapas do concurso; noutras, no ingresso ao cargo, após a aprovação em todas as etapas.
              No que se refere ao primeiro caso, ou seja, ao ato que impede um cidadão de ‘simplesmente concorrer a determinado cargo público’, por via de concurso, seja ele qual for, configura ainda mais gravoso o afronto à legalidade, pois conforme já sabido e relatado neste trabalho, o momento legal de se exigir os preenchimentos dos requisitos de habilitação contidos no edital é o do ato da posse, e não o da inscrição. É de se registrar que este entendimento tem sido cada vez mais ratificado pelos Tribunais, os quais têm classificado como ilegal o ato de exigir tais cumprimentos editalícios já no momento da inscrição do concurso pelo candidato ao pretenso cargo público.
               Já no que tange à segunda hipótese, que se refere a candidato regularmente aprovado em concurso público em todas as etapas, mas cuja exclusão antecede a posse por motivo de investigação social e constatação de que seu nome consta em algum cadastro de restrição ao crédito, imposição esta condita no respectivo edital do concurso, também entendemos que persiste a ilegalidade na restrição taxativa, todavia, outros argumentos pendem para tal constatação.
              Não é à toa que diferentemente do particular, seja este pessoa física ou jurídica, a Administração Pública deve observar, na prática de seus atos, vários princípios que a regem e que a impõem a postura de preponderância diante do particular, tendo sempre como foco o interesse público, sob pena de não observar, dentre outros princípios, o da impessoalidade. Noutras palavras, não existe a Administração Pública para a realização de seus próprios interesses, mas tão somente para o alcance do interesse público, daí a sua obrigação de observar os princípios que a regem e os quais controlam e limitam o seu poder, a fim de evitar excessos ou desvios no que alude ao interesse colimado.
              Ademais, diante da complexidade que envolve a Administração Pública, haja vista o leque de interesses que esta engloba mediante a sociedade, não há que se questionar que o fato de generalizar seus atos, repetidamente e sem levar em conta especificidades, equivaleria a um verdadeiro ‘abismo jurídico’. Felizmente, a própria evolução do Direito e as decisões que emanam dos nossos Tribunais se incumbem de atualizar a aplicação da lei, coibindo que atos desprovidos de flexibilidade e cuja rigidez das leis o tornaram injustos ou ilegais sejam evitados ou invalidados.
            No caso em foco, em que um candidato ao ingresso em cargo público é excluído e considerado reprovado por ter, à época da posse, seu nome inscrito em cadastros de restrição ao crédito, se nos parece esculpido de total falta de razoabilidade por parte do administrador, característica esta que esboça o Princípio da Razoabilidade, dando-lhe a conseqüente configuração da ilegalidade.
            Pecará o administrador, se na prática de seus atos e imbuído do poder que detém, agir de maneira indiscriminada e reprovar todo e qualquer candidato que tiver seu “nome sujo”, conforme o termo vulgarmente utilizado, constatado por meio de certidões que são exigidas no edital do certame. A este propósito, há que se distinguir, e aqui entra o dever do administrador de aplicar o princípio da razoabilidade, entre o devedor contumaz que reiteradamente deixa de cumprir suas obrigações e compromissos os quais assumiu, mesmo sabedor de que não detém recursos para honrá-los, e que muitas vezes já se configura um verdadeiro estelionatário; e aquele outro devedor que, independentemente de sua vontade e/ou por razões momentâneas deixou de honrar alguns pagamentos, talvez pelo próprio fato de encontrar barreiras no mercado de trabalho, e por isso mesmo, ter se empenhado e obtido uma difícil aprovação em um emprego público. Ou seja, desclassificar este candidato, seja no ato da inscrição ou no ato da posse, seria uma maneira abusiva e totalmente infundada por parte do administrador, que ignorou a sua obrigação de observar os princípios que regem a Administração Pública, sobretudo o da razoabilidade.
            Reportando-nos à defesa do candidato, não restam dúvidas de que este deverá se valer do pré-citado princípio da razoabilidade[1], o qual se furtou de observar o administrador quando da exclusão daquele do certame público, e intentar uma ação de conhecimento e mandado de segurança para conter o abuso da autoridade e reaver o seu direito de ser nomeado e tomar posse do cargo público “ – Esclarece professor Madeira.



[1] O Princípio da Razoabilidade, que também é chamado de Princípio da Vedação do Excesso, tem por escopo adequar e compatibilizar meios e fins para que se evite, por parte do administrador público, restrições, excessos ou abusos perante o administrado, já que este tem seu direito assegurado constitucionalmente de ser tratado de forma impessoal pela Administração Pública, e com a devida razoabilidade que exige cada caso.
Inobstante, existe tal princípio para delimitar a própria atuação do administrador, pois não é raro ver-se publicamente aquele que age em nome da Administração Pública, tomando-lhe as vezes, agindo de acordo com seus interesses e valores pessoais e ignorando o interesse público. Não é demais também lembrar que a razoabilidade está intimamente ligada às reais necessidades da coletividade e à legalidade e à economicidade públicas.


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